
Mensuração da cooperação Sul-Sul
A cooperação Sul-Sul (CSS) emerge, nos anos 1950, para promover a autonomia dos países em desenvolvimento e um sistema global menos desigual. Desde então, inovações foram forjadas entre os países do Sul Global visando transcender as assimetrias estruturais, econômicas e sociais existentes entre os países. Há quarenta anos, em Buenos Aires, representantes de 138 países acordaram um plano de ação para promover e implementar a cooperação técnica entre países em desenvolvimento – CTPD. O plano de ação de Buenos Aires (PABA), de 1978, chama atenção para um contexto de mudanças na relação entre países desenvolvidos e em desenvolvimento e denuncia sua governança, anacrônica e desigual.
Na década de 2000, as relações Sul-Sul ganham novo impulso e alguns atores se destacaram e passaram a disputar espaço e narrativas do sistema internacional de cooperação para o desenvolvimento, desafiando, principalmente, as práticas e princípios dos países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico – OCDE.
Esse processo de reafirmação da cooperação Sul-Sul (CSS) coincidiu com debates sobre a efetividade da ajuda oficial ao desenvolvimento – de fato, sobre o que se entende como desenvolvimento no século XXI – e com a emergência de redes e coalizões da sociedade civil internacional mobilizadas para incidir sobre o tema, seja em âmbito nacional, seja em fóruns regionais e multilaterais.
Assim, a celebração dos quarenta anos do PABA deve contemplar a multiplicidade de atores interessados, e a riqueza e complexidade do tema não pode prescindir de debate amplo, participativo e baseado em evidências e informações de qualidade. Este relatório se insere nesse esforço e busca contribuir para um maior entendimento sobre os traços característicos da cooperação Sul-Sul brasileira.
Para tanto, a perspectiva aqui proposta é orçamentária, considera valores pagos e sugere recortes e classificações para sua análise. Partimos da premissa que a cooperação Sul-Sul não pode ser quantificada apenas por meio de fluxos financeiros. Entre- tanto, um maior entendimento sobre a alocação de recursos orçamentários é fundamental para a compreensão das práticas de CSS nacionais: tanto no que diz respeito à sua natureza, quantidade e distribuição setorial, como em relação ao seu processo decisório e às prioridades estabelecidas ao longo dos anos.
Esperamos que a metodologia, e os primeiros resultados de sua aplicação aqui apresentados, reforcem a transparência da CSS brasileira e contribuam para ampliar sua legitimidade e base de apoio doméstica, para promover a prestação de contas junto aos países parceiros, e para fazer transparecer sua contribuição aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
Adicionalmente, ao revelar a lógica orçamentária da CSS brasileira, busca-se fortalecer a institucionalidade da mesma, apontando para recomendações específicas para o aprimoramento do registro orçamentário das ações de CSS, assim como para aqueles âmbitos que necessitem ser reforçados com instrumentos administrativos e jurídicos apropriados.
A metodologia proposta é aberta e sujeita a revisões – mais do que isso, ela requer um monitoramento ativo e constante do orçamento federal, para o qual pretende ser instrumento. De forma mais geral, trata-se do resultado de um bem-sucedido processo de diálogo e articulação junto ao Governo e a atores não governamentais, acadêmicos, pesquisadores e ativistas, sobre a CSS do Brasil – o que ela é e o que ela pode vir a ser.