Em 25 de agosto de 2014, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) realizou, em São Paulo (SP), o seminário África negócios. O evento reuniu empresários, especialistas e representantes de organizações que atuam no continente.
Debateu-se sobre focos de crescimento no continente e as dinâmicas políticas e econômicas que sustentam esse movimento; o cenário atual dos investimentos diretos brasileiros nos países africano, os instrumentos da política brasileira que podem proporcionar maior engajamento do setor privado no continente e a participação brasileira em importações e exportações com a África. Para acessar às apresentações feitas durante o seminário clique aqui.
África está crescendo rápido, mas se transformando devagar
Jorge Arbacho Professor da UNB, discorreu sobre fontes e características de crescimento das economias africanas. Segundo Arbacho, o padrão de crescimento do continente africano é caracterizado por grandes acelerações de crescimento seguidos de fortes colapsos, o que resulta em uma taxa média de crescimento baixa e que desafia o crescimento sustentado. Durante os períodos de colapso existe uma deterioração desproporcional de indicadores sociais e institucionais e não há oportunidade de distribuir regionalmente o crescimento obtido.
Entre as principais causas de crescimento do continente figuram o aumento dos preços das commodities; melhores políticas econômicas; classe média em ascensão, emprego de novas tecnologias de forma inteligente; melhoria do ambiente de negócios e países que poderiam se tornar fonte de crescimento e desenvolvimento regional, promovendo spillovers regionais positivos (Botswana, Cabo Verde, Angola, Moçambique, Tanzânia, Chade, Guine Equatorial, Sudão).
Os desafios, por sua vez, se relacionam à produtividade da agricultura; diversificação da economia; elevada dependência de commodities; indústria ainda incipiente; capital humano; burocracia e instituições ainda frágeis; limitada integração econômica regional e infraestrutura ineficiente.
Como possibilidades para contornar esse cenário citou atividades que requeiram relativamente baixo investimento de capital por trabalhador, atividades que industrializem as vantagens comparativas e competitivas, explorem o consumo regional e fomentem a complementaridade econômica regional.
Investimento na África: tendências, setores e países
Michael Labour, da Ernst Young, comentou sobre pesquisa realizada com 500 líderes empresariais do mundo todo concluindo que a percepção dos investidores têm melhorado nos últimos anos, sendo que aqueles que já se encontram fazendo negócios no continente afirmam continente é altamente atrativo e lucrativo, enquanto entre os que não estão ainda no continente a percepção de atratividade é baixa. Segundo o consultor, o investimento estrangeiro direto (IED) está se direcionando principalmente para Gana, Nigéria, Quênia, Moçambique, Tanzânia, Uganda, Zâmbia, África do Sul. Além disso, o IED apresenta uma mudança de tendência: no período compreendido entre 2003-2007 se distribuía igualmente entre metais e mineração, serviços, comércio, tecnologias e financeiro. Já em 2013 o setor de metais e mineração diminui significativamente e o IED começa a se concentrar em serviços e tecnologia.
A consultora Melissa Cooke, alertou para alguns fatores que devem ser levados em conta por empresários que queiram investir na África: rápida urbanização, crescimento da classe média, infraestrutura, penetração das TICs, agricultura e integração regional. Com relação às relações entre Brasil e África, além dos tradicionais setores como construção e mineração, que já contam com a presença de grandes empresas brasileiras como Odebrecht e Vale do Rio Doce, serviços de saúde e indústria manufatureira são setores que têm espaço para pequenas empresas que buscam parceiros locais, mas é necessário um trabalho de aproximação a longo prazo. Segundo Melissa, empresas brasileiras são bem vindas pois a percepção é que empresas brasileiras investem na formação de trabalhadores locais.
Instituições e Investimento
O Embaixador da Nigéria, Adamu Azimeyeh Emozozo, destacou que a África não é um continente homogêneo e isso deve ser considerado pelos investidores interessados em estabelecer negócios na África. Segundo o embaixador, cada país conta com seus próprios desafios e soluções elaboradas a nível nacional e regional, portanto faz-se necessário considerar o papel das instituições. Destacou ainda que, durante os últimos 15 anos a África conta com uma geração de líderes que buscam promover desenvolvimento para o continente, fortalecendo suas instituições e buscando que todos os africanos possam se beneficiar desses movimentos de crescimento. O que se busca para a África são parceiros que invistam, criem trabalhos e que se beneficiem das oportunidades.
Juventude e Formação
Ao falar sobre capital humano, o continente apresenta potencialidades e desafios. Os jovens africanos são dinâmicos, empreendedores e engajados. Com relação à disponibilidade de profissionais capacitados para trabalharem em empresas de serviços, debateu-se sobre a importância da contribuição das empresas com a formação dos trabalhadores. Também foram assinalados como fatores de desenvolvimento a importância de que os trabalhos gerados sejam assalariados, para garantir a estabilidade necessária para uma especialização. Finalmente, alertou-se para o papel das instituições de treinamento profissional, como o SENAI.
Investimentos Diretos Brasileiros
Pedro da Motta Veiga, diretor do Centro de Estudos de Integração e Desenvolvimento, indicou que o primeiro ciclo de IDE brasileiro aconteceu na década de oitenta, liderado pela Petrobrás e grandes construtoras em Angola, Congo, Líbia e Argélia. Hoje 50% dos ativos dessas empresas se encontram distribuídos entre Nigéria, Tanzânia , Angola, Benin, Gabão e Namíbia. O segundo ciclo, acontece a partir dos anos 2000 e apesar de mais diversificado, não alterou a característica de concentração da presença brasileira no continente. Das 29 empresas que contam com financiamento do BNDES hoje, 21 se estabeleceram a partir de 2005 e 11 a partir de 2009. Angola, Moçambique e África do sul são os principais destinos dos investimentos brasileiros que se dão principalmente nos setores da construção civil, mineração, exploração e produção de gás e minerais. Outros países do norte da África, como Egito e Líbia contam com menor investimento. Pedro avaliou que o peso dos setores de infraestrutura e mineração chama atenção também pela sua sensibilidade política e socioambiental, já que implicam relações complexas com stakeholders e compete diretamente com a China nesses setores.
Ressaltou que grande parte do que está sendo chamado de IDE é, na verdade, exportação de serviços (construtoras e em menor medida empresas investindo em setores do comércio). Existem poucos investimentos em indústria e agricultura (com excessão da Pinesso, Odebrecht Agro e Embrapa) e a mineração ganhou peso no último ciclo, mas apoia-se em apenas um ator, a Vale do Rio do Doce. O setor industrial tem empresas que buscam novos mercados e entram gradualmente em etapas de montagem ou via joint venture com parceiros locais. Ainda assim o Brasil é um investidor secundário no continente, com pouca participação. Com relação à diversificação geográfica da presença brasileira, Pedro detalhou que os países que contam com maior presença das empresas brasileiras são Moçambique África do Sul e Angola, além da Argélia. Das 29 empresas financiadas pelo BNDES, doze estão em um só pais, AG e Odebrecht e Vale encontram-se em nove países e a Petrobrás em oito (mas em fase de desinvestimento).
Instrumentos da política brasileira com impactos potenciais sobre IDE na África
Foram citadas as linhas de financiamento às exportações de bens e serviços, incluindo buyer’s credit (exim automático a partir de 2011); linha de apoio à internacionalização produtiva do BNDES (ainda não usado), escritório BNDES África do Sul (a partir de 2013); créditos concessionais em projetos de cooperação técnica (ajuda amarrada); perdão de dívidas; diplomacia e as recentes assinaturas de acordos de cooperação e facilitação de investimentos. Segundo Veiga, os instrumentos que vêm se mostrando mais efetivos hoje estão relacionados ao comércio de bens e à exportação de serviços, como são as linhas de créditos as exportações do BNDES, perdão de dívida e créditos concessionais. Os instrumentos especificamente voltados para IDE ainda são pouco efetivos e existem obstáculos horizontais à internacionalização e às atividades das empresas no exterior (tributação desfavorável).
Veiga chamou a atenção para o fato de que hoje o investimento brasileiro é muito sensível à agenda política da África e por isso faz se importante pensar a relação entre as agendas de IDE, comércio e cooperação. Com relação à articulação entre comércio e cooperação, os créditos concessionais e o perdão da dívida são instrumentos clássicos que estimulam essa relação. A combinação entre investimentos e comércio pode estar na diversificação de produtos e setores, que podem gerar incentivos para IDE, pois a intensificação das relações dependem dos tipos de produtos e regiões. Por sua vez, a combinação entre investimento e cooperação passa pela agenda de Responsabilidade Social Corporativa, importante para os setores de investimento brasileiros na África, mas podem ser exploradas também outras relações que dependam mais da atuação governamental.